sexta-feira, fevereiro 20, 2004

::: Estar sozinho :::
Tatiane Bernardi - Revista TPM
Uma reflexão sobre a solidão
Estar sozinho é engraçado, louco, angustiante, libertário e triste, tal qual estar com alguém.
No entanto, estar sozinho é absolutamente o oposto de estar com alguém.
Estar sozinho é fechar as mãos no nada quando se atravessa a rua correndo e não se tem uma mão para segurar.
É acordar sem saber o que será do dia porque planejar sozinho dá preguiça.
É falar a coisa mais engraçada do mundo para alguém que não vai rir, porque ninguém te entende tão bem.
É ficar louca sem cúmplice. Não tem graça ser fora da lei sozinho.
É querer contar tanta coisa para alguém, mas para quem?
A vida simplesmente acontece para quem está sozinho, às vezes sem que a gente perceba, pois é mais fácil ter noção de si mesmo através de outra pessoa.
Estar sozinho é fazer dengo sozinho na cama, sem ninguém para apenas encaminhar o ombro um pouco mais perto.
É comer doce demais porque sua boca precisa de um incentivo para continuar salivando vida.
É comer doce demais porque estar sozinho dá uma tremedeira estúpida de hipoglicemia.
É o doce que substitui mal e amargamente o sexo.
Estar sozinho é dormir até tarde no domingo. Não para congelar o tempo na alegria, mas para fazer de conta que o tempo não existe.
É conviver com a ansiedade de que você pode encontrar alguém especial a cada esquina, então você tenta ficar bonita. Mas seus olhos não mentem o cansaço da espera e a tristeza de estar solta, e você fica feia.
É ter a sensação de que ninguém te olha, pelo menos não como você gostaria de ser olhada.
Estar sozinha é estar solta e, no entanto, é estar amarrada ao chão porque nada te faz flutuar, sonhar, divagar.
Estar sozinho, ou estar sozinha, pode acontecer com qualquer um. E você torce para que aconteça com a sua melhor amiga, ou com aquele homem que você gostaria de experimentar como uma pílula para a sua solidão.
Estar sozinha é não suportar ouvir a palavra solidão porque ela faz sentido. E o sentido dela dói demais.
Estar sozinho é ter uma risada nervosa, de quem segura um grito e um choro enquanto ri. Um riso falso para se convencer de que é possível ficar sozinho sem ficar deprimido.
Estar sozinho é usar roupas provocantes sem se sentir sexy com elas. É conferir a caixa de e-mails com uma freqüência que beira a compulsão. É chorar do nada. É acordar do nada. É morrer de medo do nada que fica no estômago.
Estar sozinho é uma coisa física, ou melhor, é a falta dela. Você se sente oco por dentro, por isso aquele respiro profundo de lamentação.
É cogitar enlouquecer.
O ombro pesa porque é tenso ficar sozinho. E porque não tem ninguém pra te fazer massagem também.
Quando chove, venta, escurece, e você está sozinho, você lembra de Deus e do quanto é pequeno.
Estar sozinho é se aproximar de Deus por piedade própria e não por agradecimento, que é o que nos faz aproximar Dele quando estamos amando.
Estar sozinho é detestar ficar em casa. Ficar em casa sozinho, quando se está sozinho, é muita solidão.
Então você sai, só para não ficar em casa sozinho. E descobre o quanto você é sozinho. E volta pra casa sozinho, e chora vendo fotos.
Estar sozinho é implorar paixão e loucura com um olhar para o carro ao lado, segundos antes de você ver que ele não está sozinho.
É trabalhar para passar o tempo e só conseguir escrever títulos, roteiros, spots e textos chatos, sem inspiração.
É procurar um olhar pela rua e andar por aí com cara de louco.
É estar pronta para algo novo e não agüentar mais dias iguais.
É ocupar a vida de açúcar, intrigas, fofocas, encrencas. Aventuras tortas.
É ocupar a vida dos outros com reclamações, lamentações, dúvidas e carências.
Resumindo: estar sozinho é triste, enche o saco dos outros e deve fazer mal para a saúde.

sexta-feira, fevereiro 06, 2004

::: Cadê a tampa da minha panela, o chinelo do meu pé cansado, a metade da minha laranja? :::
Tatiane Bernardi - Revista TPM

Tá em ebulição, vazando, transbordando, e nada da tampa da panela pra socorrer a lambança. É culpa da pressão que eu ponho em tudo isso? É o que dizem: desencana que uma hora ele aparece.
O pé cansado já tentou calçar (à força) do chinelão que descola as tiras ao sapatinho de cristal. Nenhum serviu e o coitado tá todo esfolado.
Ninguém pra descascar, chupar ou fazer uma laranjada. Em compensação, laranjas na minha vida não faltam. E chega! Há anos peço o príncipe e só me mandam o cavalo.
Fim de ano sem amar é deprê, hein? Tô megera o suficiente pra ver uma família feliz no shopping e pensar que aquela instituição “image bank” não passa de uma união solitária de aparências. Tô megera o suficiente pra furar a fila do Papai Noel e pedir um pirulito, bem grande, bem grosso, bem exclusivamente apaixonado por mim.
Tô megera o suficiente pra abraçar os veadinhos do trenó em homenagem aos meus ex-casos. Tô megamegera o suficiente pra não admitir minha carência e dar uma risada debochada de todas as luzes, canções e emoções de boas-festas.
Tá, mas no especial do Roberto Carlos não vai dar pra ser megera. O filho da mãe sempre me faz chorar. É impressionante como a gente se sente sozinha na porra do especial do Roberto Carlos.
É claro que eu desejo o meu sucesso profissional, dinheiro, saúde, ..., mas nada de atacar para todos os lados nas simpatias deste réveillon. Não dá certo. Este ano vou focar no amor: calcinha vermelha, fitinhas vermelhas e as sete ondas vão ser puladas com a mão no coração (se eu usar a frente-única branca que comprei, é bom que a mão no coração já segura um peito) e uma só intenção: encontrar o danado.
Ah, sejamos sinceras mulheres modernas: no fundo, no fundo, a gente quer mesmo é alguém pra dormir protegida no peito (de preferência largo, forte e levemente cabeludo).
E nem é medo de ficar pra titia não, além de ter cara de mais nova e ser bem
nova, eu sou filha única. É vontade de sentir aquela coisinha misteriosa de “é esse!”. Como será sentir isso? Eu sempre sinto que “pode ser esse, ou talvez com algumas mudancinhas possa ser esse ou talvez se ele quisesse, poderia ser esse...”. Não, isso tá errado. Quero sentir que “é esse”.
Dizem que materializar os sonhos escrevendo ajuda, então lá vai: quero transar com beijo na boca profundo, olhos nos olhos, eu te amo e muita sacanagem, quero cineminha com encosto de ombro cheiroso, casar de branco, ser carregada no colo, filhos, casinha no campo com cerquinha branca, cachorro e caseiro bacana. Quero ouvir Chet Baker numa noite chuvosa e ter de um lado um livrinho na cabeceira da cama e do outro o homem que amo.
Quero sambão com churrasco e as famílias reunidas. Quero ter certeza, ali no fundo da alma dele, de que ele me ama. Quero que ele saia correndo quando meu peito amargurado precisar de riso. Que ele esqueça, de vez em quando, seu lado egoísta, e lembre do meu. Que a gente brigue de ciúmes, porque ciúmes faz parte da paixão, e que faça as pazes rapidamente, porque paz faz parte do amor. Quero ser lembrada em horários malucos, todos os horários, pra sempre. Quero ser criança, mulher, homem, et, megera, maluca e, ainda assim, olhada com total reconhecimento de território. Quero sexo na escada e alguns hematomas e depois descanso numa cama nossa e pura. Quero foto brega na sala, com duas crianças enfeitando nossa moldura. Quero o sobrenome dele, o suor dele, a alma dele, o dinheiro dele (brincadeira...). Que ele me ame como a minha mãe, que seja mais forte que o meu pai, que seja a família que escolhi pra sempre. Quero que ele passe a mão na minha cabeça quando eu for sincera em minhas desculpas e que ele me ignore quando eu tentar enrolá-lo em minhas maldades. Quero que ele me torne uma pessoa melhor, que faça sexo como ninguém, que invente novas posições, que me faça comer peixe apimentado sem medo, respeite meus enjôos de sensibilidade, minhas esquisitices depressivas e morra de rir com meu senso de humor arrogante. Que seja lindo de uma beleza que me encha de tesão e que tenha um beijo que não desgaste com a rotina. Que a sua remela seja sequinha e não gosmenta e que o tempo leve um pouco de seu cabelo (adoro carecas...). Que suas escatologias não passem de piada e se materializem bem longe de mim. Tem que gostar de crianças, de cachorrinhos, da minha mãe, e tem que odiar ver pessoas procurando comida no lixo. Tem que dançar charmoso, ser irônico, ser calmo porém macho (ou seja, não explodir por nada mas também não calar por tudo). Tem que ser meio artista, mas também ter que saber cuidar dos meus problemas burocráticos. Tem que amar tudo o que eu escrevo e me olhar com aquela cara de “essa mulher é única”.
É mais ou menos isso. Achou muito? Claro que não precisa ser exatamente assim, tintim por tintim. Exigir demais pode fazer eu acabar sozinha em mais shows do Roberto Carlos. Deus me livre! Bom, analisando aqui, dá pra tirar umas coisinhas. Deixa eu ver... Resumindo então: tem que dizer que me ama e me amar mesmo, tem que rolar umas sacanagens e não pode ter remela gosmenta. Pronto!
E quando eu tiver tudo isso e uma menina boba e invejosa me olhar e pensar que “aquela instituição feliz não passa de uma união solitária de aparências” vou ter pena desse coração solitário que ainda não encontrou o verdadeiro amor.

terça-feira, fevereiro 03, 2004

::: Tudo na Vida Acaba :::
Antonio Caetano

Não chore. Tudo nesta vida acaba. Até o amor - que só parece eterno se a morte o interrompe. Também o amor, o verdadeiro amor, é uma espécie de solidão. Também o amor lembra a imagem que nos devolvem os espelhos: útil, minuciosa e muda, nela vemos o que quer ver nossa vaidade ou nossa melancolia.
Não chore nem se interrogue sobre as razões do outro para partir talvez quase sem explicação. Quando amamos, não nos ocorre perguntar porque amamos ou somos amados. Menos sentido ainda há em perguntar porque deixamos de amar ou de ser amados. Não, não haverá resposta.
A boa filosofia nos ensina que a causalidade, a generalização e a negação, instrumentos necessários quando se trata de fazer ciência, não existem como relação real neste mundo - onde imperam a liberdade, o acaso, a singularidade e o ser. É, portanto, inútil buscar causas ou tentar extrair da experiência passada alguma máxima consoladora que nos previna de dores futuras.
Não chore mais. Nos apegamos à dor - ou ao menos eu me apeguei a ela quando algo semelhante me ocorreu - porque talvez no fundo saibamos que a dor é ainda o último vestígio do amor que nos recusamos a perder. E dói dobrado saber intimamente que até esta dor passará e então não restará mais nada, a não ser talvez uma vaga e indiferente lembrança (como fotos esquecidas no fundo de uma gaveta).
Pare de chorar. Não seja injusta. Desejar que algo permaneça ou volte a ser o que era é desejar o impossível. A aceitação talvez seja a única coisa a se aprender nesta vida. Não, claro, a aceitação involuntária a que nos obriga a covardia, mas a aceitação que é fruto da generosidade. A vida é pródiga e exuberante. E a finitude o preço que pagamos por sermos únicos.
Se ele voltar, que esteja destinado a encontrar uma outra mulher a quem terá de aprender de novo a amar e a fazer-se amado - e não alguém que, castigada pela ausência, seria capaz de tudo para conservá-lo. Não faça isso: tamanha submissão se tornaria um vício que estragaria a alma dos dois.
Há um sol imenso lá fora. Aceite-o. Você é jovem e bonita e certamente outros homens espreitam. Vá. O sol, o mar, o vento, o galanteio e o olhar dos homens irão aos poucos devolvendo a você a alegria. O tempo fará o resto.
Mas, não esqueça: tudo acaba. É preciso estar ciente disso para fazer com que as coisas durem o quanto puderem durar. Esta a única eternidade possível nesta vida. A única, aliás, desejável.
::: Como se mede uma pessoa :::

William Shakespeare

Os tamanhos variam conforme o grau de desenvolvimento. Ela é grande pra você
quando fala do que leu e viveu, quando trata você com carinho e respeito,
quando olha nos olhos e seu sorriso é destravado.

É pequena pra você quando só pensa em si mesma, quando se comporta de uma
maneira pouco gentil, quando fracassa justamente no momento em que teria que
demonstrar o que há de mais importante entre duas pessoas: a amizade.

Uma pessoa é gigante pra você quando se interessa pela sua vida, quando
busca alternativas para o seu crescimento, quando sonha junto.

É pequena quando desvia do assunto.

Uma pessoa é grande quando perdoa, quando compreende, quando se coloca no
lugar do outro, quando age não de acordo com o que esperam dela, mas de
acordo com o que espera de si mesma.

Uma pessoa é pequena quando se deixa reger por comportamentos clichês. Uma
mesma pessoa pode aparentar grandeza ou miudeza dentro de um
relacionamento,pode crescer ou decrescer num espaço de poucas semanas: "será
ela que mudou ou será que o amor é traiçoeiro nas suas medições?"

Seguidas atitudes que magoam a outra pessoa pode diminuir o tamanho de um
amor que parecia ser grande.

Uma ausência pode aumentar o tamanho de um amor que parecia ser íntimo.

É difícil conviver com esta elasticidade: as pessoas se agigantam e se
encolhem aos nossos olhos. Nosso julgamento é feito não através de
centímetros e metros, mas de ações e reações, de expectativas e frustrações.


Uma pessoa é única ao estender a mão, e ao recolhê-la inesperadamente se
torna mais uma.

O egoísmo unifica os insignificantes.

Não é altura, nem o peso, nem os músculos que tornam uma pessoa grande.

É a sua sensibilidade sem tamanho."
::: Piercing no nariz :::
Antonio Caetano

- O que você acha de eu colocar um piercing?
- O quê?
- Um piercing.. No nariz.
- No nariz?
- É... Mas não é um "loop" grandão. É só um "stud"azulzinho...
- Por falar nisso, como vão os estudos?
- Não muda de assunto... O que você acha?
- Não sei... Você quer?
- Não sei...
- No nariz?
- É...
- Mas no nariz onde?
- Como onde? Até parece que meu nariz é grande! Só pode ser aqui do lado. Um pontinho só...
- Sei...
Na verdade, eu não sei nada. Repito as respostas sob a forma de perguntas para ganhar tempo e preencher o silêncio que pesa muito mais numa conversa telefônica.
- Você acha bonito?
- Acho...
É, até acho bonito piercing. Só que ficou uma coisa comum demais, como as tatuagens. É quase sempre mero capricho, sem significado nenhum. Mas como explicar isso para uma menina de quinze anos? Nessa idade, tudo é urgente, necessário, imprescindível. E tudo parece meio errado do jeito que está. É como se fosse um absurdo a gente já não ter nascido com o nariz furado e precisasse corrigir a natureza.
Passa o tempo - e nem costuma ser muito - e a gente acaba se enjoando daquilo. E aí começa o problema: desfazer é sempre mais difícil do que fazer.
Por isso, sou um tanto cético em relação a novidades. Não se fazem escolhas definitivas aos quinze anos. Mas ser cético é uma forma de conservadorismo - palavra que, se é abominável aos 45 anos, o que dirá aos 15, quando para escapar dela, qualquer um seria capaz de atravessar uma flecha de uma bochecha a outra, ainda que isso limitasse o consumo de chicletes.
- Se eu fosse você, deixava seu nariz sossegado... Essas coisas são perfeitamente adiáveis...
- Você é um chato!
- Só não gosto de nada definitivo...
- Vai ver que foi por isso que você nunca casou!
- Vai ver, foi mesmo...
- Sabe de uma coisa? Acho você muito imaturo!
- Ainda bem que você me compreende...
::: It Must Have Been Love :::
Roxette

Lay a whisper on my pillow,
leave the winter on the ground.
I wake up lonely,
there's air of silence in the bedroom and all around.
Touch me now,
I close my eyes and dream away.

It must have been love but it's over now.
It must have been good but I lost it somehow.
It must have been love but it's over now.
From the moment we touched 'til the time had run out.
Make-believing we're together,
that I'm sheltered by your heart.
But in and outside I've turned to water like a teardrop in your palm.
And it's a hard winter's day, I dream away.
It must have been love but it's over now,
it was all that I wanted,
now I'm living without.
It must have been love but it's over now,
it's where the water flows, it's where the wind blows.