segunda-feira, novembro 12, 2018

::: A Teoria do Pote :::
Laura Pires

Relacionamento requer boa vontade. É preciso entender que pessoas são diferentes e dão graus diferentes de importância às coisas. Algo que não significa nada pra você e às vezes nem passa pela sua cabeça pode ser muito importante pra outra pessoa e vice-versa. É preciso querer entender essas diferenças e respeitá-las.

Quando conheci meu namorado, muito antes de me interessar por ele, ele era casado. Um dia, em grupo, alguém falou que “mulher adora pote”. E ele disse que sim, que a esposa dele vivia reclamando que ele perdia potes. Contou que jogava futebol todo domingo e levava pão de alho num pote. Às vezes, esquecia de levar o pote de volta pra casa e pra sempre estava perdido o pote. Ela reclamava e ele não entendia por quê:

— Cara, é só um pote. Com dois reais você compra outro no Mercadão de Madureira!

Todos riram e concordaram. Onde já se viu ligar tanto pra um pote? Na época, não tínhamos intimidade nenhuma e por isso fiquei quieta.

Corta para o nosso segundo encontro, meses depois. Em algum momento, nos lembramos da história do pote. Falei:

– Olha, eu não quis dizer nada antes, porque não quis me meter, mas posso falar? Você tá errado.

– Como eu tô errado?! É só um pote! — Ele estava inconformado. Prossegui:

– Pra você é só um pote. Pra ela não é. Não interessa que você pode comprar outro com facilidade depois e repor, não interessa que é barato. O que interessa é que ela te pedia o pote de volta e você nunca lembrava. Era algo importante pra ela. E você viver esquecendo o pote mostra que você não dava importância pro que era importante pra ela. Você não precisa concordar que o pote é importante, você não precisa entender por que o pote é importante. Mas, se uma pessoa que você ama acha algo importante, você faz a gentileza de dar importância também.

Ele ficou embasbacado. De lá pra cá, lembramos sempre da história do pote. Somos pessoas muito diferentes, então é muito útil lembrar disso: mesmo não entendendo certas coisas um do outro, se nos amamos, devemos respeitar e agir de acordo.

É aquela história clássica da toalha molhada em cima da cama. Tudo começa como um pequeno incômodo: você não gosta que a toalha molhada fique largada em cima da cama e seu/sua companheiro/a vive esquecendo de colocá-la no lugar. Com o tempo, são tantas vezes que você tem que reclamar — ou desistir — disso, que deixa de ser sobre a toalha e passa a ser sobre a pessoa não te ouvir, não tentar te agradar, não dar atenção ao que você quer etc. Isso se torna um poxa, que que custa botar a toalha no lugar, sabendo que vai me aborrecer deixar em cima da cama, que facilmente leva a um ele/a não liga pra mim.

Talvez isso esteja soando dramático e categórico demais. Não quero dizer que esquecer das coisas significa que não ama de verdade. O que estou dizendo é que um esforço mínimo para se lembrar de coisas que são importantes para a pessoa com quem você se relaciona — e não apenas das que são importantes para você — pode melhorar muito a qualidade de um relacionamento. Fazer pela pessoa o que ela acha importante, mesmo que você não ache, é uma forma crucial de cooperação — e evita muita dor de cabeça. É uma questão de fazer a pessoa perceber que você se importa com o que ela pensa, sente, quer, prefere.
Esquecer os potes toda semana só porque não concorda que potes importam é toda semana passar por cima dos sentimentos de quem não queria perder esses potes. Imagina o desgaste que é, toda semana, não se sentir ouvida/o.

Nenhuma relação sobrevive se você não se preocupa em lembrar dos potes.

quinta-feira, outubro 04, 2018

::: A Tainha e a Barracuda :::
Andrew Matthews

Ao alegar suas limitações, as pessoas dizem: “eu não posso fazer tal coisa porque…” E, a desculpa comum é do tipo – "é assim que eu sou". Mas, a verdade mais provável é: "é assim que eu penso que sou". Nós podemos aprender sobre nossas crenças estudando os peixes… Compre um aquário e divida-o pela metade com uma parede de vidro transparente. Depois arranje uma tainha e uma barracuda – peixe que come tainha. Ponha cada um de um lado e, no mesmo instante a barracuda vai avançar para pegar a tainha só que… bumba!… entra de cara na parede de vidro. Ela vai recuar e atacar outra vez e… bumba!… Em uma semana a barracuda vai estar com o nariz bem inchado e, percebendo que caçar tainha é sinônimo de dor, acaba desistindo. Aí, removendo a parede de vidro sabe o que acontece? Ela passará o resto da vida no seu lado do aquário; será até capaz de morrer de fome, mesmo tendo uma bela tainha nadando a poucos centímetros dela. Ma
s como conhece seus limites não vai ultrapassá-los. A história da barracuda é triste? É...sim. Pois essa é também a história de todo ser humano.

Nós não colidimos com paredes de vidro, mas colidimos com professores, pais, filhos, amigos que nos dizem o que nos convém e o que podemos fazer. Pior ainda, colidimos com nossas próprias crenças – são elas que delimitam nosso território, é isso que alegamos para não ultrapassar os limites… Ou seja, criamos nossas gaiolas de vidro e pensamos que é realidade. Na verdade é apenas aquilo em que nós acreditamos… Quase todos nós temos uma história, e nos rotulamos… "eu sou professor", "eu sou avó", "eu sou mãe", "eu sou marido", eu sou…eu sou...eu sou...isto ou aquilo, eu sou... Essa nossa história é como um programa de computador instalado entre nossas orelhas, que nos controla a vida… Nós o levamos ao trabalho, nas viagens de férias, nas festas… enfim passamos a vida tentando nos adaptar à história… Tentar ajustar-se a uma história torna qualquer um infeliz… Eis então a dica: você não é a sua história e ninguém dá a mínima para isso. Você não pertence a uma categoria, a um compartimento. Você é um ser humano justamente porque tem uma série de experiências. E, quando você parar de arrastar uma história por aí, você vai ser muito mais feliz.