quinta-feira, julho 31, 2008

::: Minha Filosofia :::
John Lennon

Amo a liberdade, por isso deixo as coisas que amo livres. Se elas voltarem é porque as conquistei. Se não voltarem é porque nunca as possuí.

::: Todo Mundo Vai Embora :::
Tati Bernardi

Em algum momento, em vários deles ou definitivamente, as pessoas sempre vão embora. Talvez essa seja a pior coisa do mundo.

Ele vai embora, sempre, quando eu preciso de quinze minutos de silêncio complementar à minha entrega, odeio o desespero dele por banhos e a sua ansiedade curiosa pelo que vem depois. Que se dane o depois, eu sou agora, ou pelo menos era.

Ele vai embora, sempre, quando o parágrafo passa de três linhas, o pensamento dele ultrapassa meus olhos, o som se perde da minha boca para qualquer outro canto do mundo que não tenha seus ouvidos e ele olha fixamente para qualquer outra coisa que não seja a minha existência. Sempre a mesma cara de tédio e de busca pelo resto que não se repete ou não se prolonga.

Ele sempre vai embora quando eu queria que ele se perdesse um pouco, rasgasse a agenda, lançasse o celular no rio, desligasse todos os toques, luzes e sinais de que há todo o resto. Esquecesse do sono, do livro, da planta, das lembranças. Ele sempre vai embora do meu mundo quando eu só queria que ele descansasse um pouco de ser ele o tempo todo, mas ele tem muito medo de não ser ele, talvez porque ele não saiba o que ele é.

Ele sempre vai embora pra descobrir quem ele é, ou para lembrar que ele é o mesmo de sempre que não sabe quem é, ele sempre vai embora antes da gente ser alguma coisa juntos.

Vivo com essa sensação de abandono, de falta, de pouco, de metade. Mas nada disso é novidade. Antes dele, teve o outro, o outro que continua indo embora para sempre porque nunca foi embora pra sempre. Eu não sei deixar ninguém partir, eu não sei escolher, excluir, deletar. São as pessoas que resolvem me deixar, melhor assim, adoro não ser responsável por absolutamente nada, odeio o peso que uma despedida eterna causa em mim. Nada é eterno, não quero brincar de Deus.

O outro foi embora a primeira vez porque estava bêbado demais, foi embora a segunda porque ficou tarde, foi embora a terceira porque teve medo de ficar pra sempre, foi embora durante alguns longos anos porque todo o resto do mundo precisava dele e eu era apenas uma das demandas. Ele me chamou de demanda a última vez que foi embora pra sempre, mas pra sempre pode durar duas horas, dois anos ou duas encarnações. A gente sempre se despede lembrando da música do Chico que diz “o amor não tem pressa, ele sabe esperar em silêncio”.

Antes dele teve ainda um outro que sempre ia embora na espera de que existisse algo melhor do que eu, mas não ia definitivamente porque não é todo dia que aparece alguém melhor do que eu. Um dia apareceu, ela até que é bonita e tal, não parece tão confusa e intensa e talvez mediocridade seja tudo de que uma pessoa precise para ser feliz. Mas a última vez que ele foi embora, antes me deu um abraço de quem nunca saiu do mesmo lugar. O abraço e o seu olhar de quem nunca sabe direito porque vai embora ficaram pra sempre comigo.

Hoje meu novo amigo foi embora, não pra sempre, mas um segundo pode ser pra sempre se pensarmos grandiosamente, e ele me dá vontade de pensar grandiosamente. Fazia tempo que alguém não ficava tão calado enquanto eu apenas existo, fazia tempo que alguém não ficava tão perdido só porque me encontrou, fazia tempo que eu não me olhava no espelho e sorria, sabendo que sim, sim, sim, sou bonita ora bolas! Sou interessante! Da onde eu tinha tirado o contrário nos últimos meses?

Todo mundo chega na sua vida. Em algum momento, em vários deles ou definitivamente, as pessoas sempre chegam. Talvez essa seja a melhor coisa do mundo.

Como naquele texto que não lembro, daquela pessoa que não lembro, e sobre o qual você me contou de um jeito que eu nunca mais vou esquecer, no final a gente acaba mesmo numa esquina qualquer, lembrando de alguém que um dia chegou e depois foi embora, perplexo.

terça-feira, julho 29, 2008

::: I'll Remember You :::
Sophie Zelmani

It's daybreak, and you are asleep
I can hear you breathe now
Your breath is deep

But before I go
I'll look at you one last time
I can hear a heart beat, is it yours or is it mine?

I look at your lips, I know how soft they can be
Did they know what they wanted, the times they kissed me

And your hands, that I've held in mine
Now they're reposing on the pillow
Will they ever miss me sometime?

I'll remember you, you will be there in my heart
I'll remember you, but that is all that I can do
But I'll remember

Your eyes, that always make me shiver
Now they're closed, they just sometimes twitch a little
And your body, I could hold for an hour
It sent me to heaven, with its heat and power

domingo, julho 27, 2008

::: Cariocas :::
Adriana Calcanhoto

CARIOCAS SÃO BONITOS
CARIOCAS SÃO BACANAS
CARIOCAS SÃO SACANAS
CARIOCAS SÃO DOURADOS
CARIOCAS SÃO MODERNOS
CARIOCAS SÃO ESPERTOS
CARIOCAS SÃO DIRETOS
CARIOCAS NÃO GOSTAM
DE DIAS NUBLADOS

CARIOCAS NASCEM BAMBAS
CARIOCAS NASCEM CRAQUES
CARIOCAS TÊM SOTAQUE
CARIOCAS SÃO ALEGRES
CARIOCAS SÃO ATENTOS
CARIOCAS SÃO TÃO SEXYS
CARIOCAS SÃO TÃO CLAROS
CARIOCAS NÃO GOSTAM
DE SINAL FECHADO

sábado, julho 26, 2008

::: Seja Ela Quem For :::
Tati Bernardi

Você olhou para o horizonte, eu querendo morrer com seus olhos azuis estragados, e me disse que o grande amor da sua vida já tinha passado.

Não podia me dizer o nome, não podia me dizer nada. Queria mudar de assunto e, pra variar, fez piadinhas idiotas para desfazer meu olhar de morte.

Pro inferno que você ia me deixar daquele jeito, eu precisava de nomes, eu precisava de motivos, eu precisava de cheiros, cores de calcinhas, comprimento de cabelos, pintinhas do dedão. Eu precisava sofrer até a última gota do sangue azedo que tinha me invadido e despertado minha obsessão.

Não se solta assim um verme "corroedor" de almas no ventre de uma mulher ciumenta e depois se pede mais água com gás pro garçom.

Eu precisava saber o que essa mulher formidável havia feito para merecer aquele seu olhar de devoção preguiçosa, algo entre o melancólico e o submisso, entre a saudade e o repúdio. O olhar que toda mulher sonha causar em um homem.

Eu precisava olhar com uma lupa para a bunda daquela vaca, aposto, aposto cem mil dólares que é dura. Certeza, só uma mulher muito gostosa enlouquece um homem a este ponto. E só uma mulher muito gostosa simplesmente dispensa um homem daqueles.

Não, nada disso. Ela é muito bem resolvida, isso sim. Ela até tem celulite e é um pouco flácida. Mas é daquelas mulheres chiques que sentam na beira do sofá com uma roupa-cara-despojada-para-ficar-em-casa e tomam vinho em taças gigantes. Ela tem um cachorro grande, tipo labrador, e faz carinho no pescoço dele enquanto pede para você escolher um disco. Ela tem uma vitrola, coloca Billie Hollyday e ri deliciosamente quando derruba um pouco de vinho no tapete felpudo branco, que combina perfeitamente com seu aconchegante apartamento clean de mulher em vias de se tornar bem-sucedida.

Ahhhhhhh se for isso, tá no papo. Aposto como você prefere um milhão de vezes o meu jeito de menina perdida, homem gosta de cuidar, não?

Ou será que é uma garotinha? Hmmmmm, estagiária, doce suor ginasial, pele dura, malícia ingênua, deslumbre inocente, meio burra sobre política, meio tapada para livros, só gosta dos rocks que estão na moda e associados a algum evento com patrocínio de celular. E música eletrônica, claro.

Bom, se for isso, você deve preferir o cd que eu gravei só com músicas antigas e boas para a gente transar quando você volta seus olhos para mim.

Ele fala uma ou duas coisas idiotas que me chamam a atenção apenas porque coisas idiotas sempre me chamam a atenção. De resto, não faço a menor idéia do que acontece fora da minha cabeça obsessiva em decifrar quem seria a mulher misteriosa.

Aliás, acabei de me lembrar da palavra mágica: mistério.

Fulana devia ser o mistério em pessoa. Dessas mulheres sérias, dessas mulheres que conseguem simplesmente não se interessar pelo mundo gritando existência lá fora e cagam para grupinhos felizes formados por suicidas em potencial que comemoram mais um dia de vida aceitando-se mutuamente.

A vaca era misteriosa, não tinha jeito. Mas uma mulher misteriosa ia rir daquele mala cheio de piadas ruins? Ela ia tomar banho enquanto ele faz xixi e arregaçar a perna para lavar com esmero cada cantinho e dobrinha da sua xoxotinha? Uma mulher misteriosa ia falar xoxotinha? Uma mulher misteriosa ia rir copiosamente durante duas horas do seu primeiro pum? E ia continuar mantendo a esportiva nos próximos puns?

Não, ela era fresca demais pra isso. E por isso ele ainda ama essa filha da puta, porque quando o homem respeita mesmo uma mulher, ele fica nervoso demais para ficar à vontade. Se bem que nervoso dá ainda mais vontade de soltar pum. Mas com ela o desgraçado devia segurar.

Mas será que é bom ficar sempre nervoso na presença de alguém? Colocar uma mulher muito no pedestal não significa não conseguir abraçá-la e viver sozinho?

Marília, ele me disse antes de eu descer do carro. O nome dela era Marília. E sorriu, vingando-se de todas as mulheres que já o haviam deixado perdido. Ele sabia que eu era o cachorro de mudança do cego em tiroteio.

Claro que passei a noite em claro escrevendo Marília no Orkut, no Google e repetindo seu nome estupidamente para meu cérebro, como se cada letra fosse mais uma peça igual da minha linha de montagem sem fim.

Marília podia ser mineira de BH, 25 anos, formada em odontologia, interessada em amigos e network. Marília podia ser uma artista plástica que faz uns passarinhos desinteressantes com papel colorido e fez um site brega para divulgá-los. Marilinha era garota de programa e topava dupla p. na bu e no c. E estava escrito assim mesmo no seu site. Marília passou em quarto lugar na Faculdade São Francisco em 2003, Marília era amiga da Mari, uma menina idiota cheia de amigas idiotas. Marília era o quinto lugar do concurso de poesia de Catanduva. Marília era dona de um currículo com experiência no pacote completo do Office 2005. Marília tinha dezesseis anos e um blog cheio de dúvidas sobre a vida. Marília, essas dúvidas vão continuar aí quando você tiver 40 anos, a diferença é que você aprende que não morre por não saber nada nesta vida. Marília era dona de uma pousada com seu marido gringo, no site da pousada tinha uma foto da Marília gorda e negra com seu marido magro e alemão. Marília era estudante da faculdade São Judas Tadeu, Marília era entrevistadora e artista, Marília era vocalista de uma banda só de mulheres, Marília deixou um recado no Orkut da sua amiga Ceci dizendo que sexta ela quer quebrar tudo na festa. Marília dos Santos Teixeira Nóbrega é cientista. Marília é Atlético Clube, universidade, faculdade, cidade, igreja, motel, mãe. Marília era alguém que dormia essa hora, enquanto minhas vísceras invejavam a sua ausência.

Marília, como todos os que fantasiamos merecerem um amor eterno e absoluto por serem perfeitos, não existia.

De tanto odiar Marília, eu amava Marília. De tanto fantasiar, de tanto tentar aniquilar minha existência, de tanto ver Marília em todas, de tanto não ver Marília, mas saber que ela está por aí, assim como a morte e as possibilidades de solidão, de tanto sentir Marília pisar em mim com salto agulha e me furar os olhos com seus cabelos fortes e lisos, de tanto esquecer Marília o tempo todo porque o tempo todo eu só pensava nela, eu resolvi fazer este texto e mandar a Marília tomar no meio do olho do cu dela. Seja ela quem for.

quinta-feira, julho 24, 2008

::: O mau elemento :::
Tati Bernardi

Eu olho pra sua tatuagem e pro tamanho do seu braço e pros calos da sua mão e acho que vai dar tudo certo. Me encho de esperança e nada. Vem você e me trata tão bem. Estraga tudo.
Mania de ser bom moço, coisa chata.

Eu nunca mais quero ouvir que você só tem olhos pra mim, ok? E nem o quanto você é bom filho. Muito menos o quanto você ama crianças. E trate de parar com essa mania horrível de largar seus amigos quando eu ligo. Colabora, pô. Tá tão fácil me ganhar, basta fazer tudo pra me perder.
E lá vem ele dizer que meu cabelo sujo tem cheiro bom. E que já que eu não liguei e não atendi, ele foi dormir. E que segurar minha mão já basta. E que ele quer conhecer minha mãe. E que viajar sem mim é um final de semana nulo. E que tudo bem se eu só quiser ficar lendo e não abrir a boca.

Com tanto potencial pra acabar com a minha vida, sabe o que ele quer? Me fazer feliz. Olha que desgraça. O moço quer me fazer feliz. E acabar com a maravilhosa sensação de ser miserável. E tirar de mim a única coisa que sei fazer direito nessa vida que é sofrer. Anos de aprimoramento e ele quer mudar todo o esquema. O moço quer me fazer feliz. Veja se pode.

E aí passa a maior gostosa na rua e ele lá, idolatrando meu nariz. E aí o celular dele toca e ele, putz, perdeu a ligação porque demorou trinta mil horas pra desvencilhar os dedos do meu cabelo. Com tanto potencial pra me dar uns tapas, o moço adora me fazer carinho com a ponta dos dedos.
Não dá, assim não dá. Deveria ter cadeia pra esse tipo de elemento daninho. Pior é que vicia. Não é que acordei me achando hoje? Agora neguinho me trata mal e eu não deixo. Agora neguinho quer me judiar e eu mando pastar. Dei de achar que mereço ser amada. Veja se pode. Trinta anos servindo de capacho, feliz da vida, e aí chega um desavisado com a coxa mais incrível do país e muda tudo. Até assoviando eu tô agora. Que desgraça.

Ontem quase, quase, quase ele me tratou mal. Foi por muito pouco. Eu senti que a coisa tava vindo. Cruzei os dedos. Cheguei a implorar ao acaso. Vai, meu filho. Só um pouquinho. Me xinga, vai. Me dá uma apertada mais forte no braço. Fala de outra mulher. Atende algum amigo retardado bem na hora que eu tava falando dos meus medos. Manda eu calar a boca. Sei lá. Faz alguma coisa homem!
E era piada. Era piadinha. Ele fez que tava bravo. E acabou. Já veio com o papo chato de que me ama e começou a melação de novo. Eita homem pra me beijar. Coisa chata.

Minha mãe deveria me prender em casa, me proteger, sei lá. Onde já se viu andar com um homem desses. O homem me busca todas as vezes, me espera na porta, abre a porta do carro. Isso quando não me suspende no ar e fala 456 elogios em menos de cinco segundos. Pra piorar, ele ainda tem o pior dos defeitos da humanidade: ele esqueceu a ex namorada. Depois de trinta anos me relacionando só com homens obcecados por amores antigos, agora me aparece um obcecado por mim que nem lembra direito o nome da ex. Fala se tão de sacanagem comigo ou não? Como é que eu vou sofrer numa situação dessas? Como? Me diz?

Durmo que é uma maravilha. A pele está incrível. A fome voltou. A vida tá de uma chatice ímpar. Alguém pode, por favor, me ajudar? Existe terapia pra tentar ser infeliz? Outro dia até me belisquei pra sofrer um pouquinho. Mas o desgraçado correu pra assoprar e dar beijinho.

terça-feira, julho 22, 2008

::: Teatro dos Vampiros :::
Legião Urbana

Sempre precisei
De um pouco de atenção
Acho que não sei quem sou
Só sei do que não gosto...

E nesses dias tão estranhos
Fica a poeira
Se escondendo pelos cantos
Esse é o nosso mundo
O que é demais
Nunca é o bastante
E a primeira vez
É sempre a última chance
Ninguém vê onde chegamos
Os assassinos estão livres
Nós não estamos...

Vamos sair!
Mas não temos mais dinheiro
Os meus amigos todos
Estão procurando emprego...

Voltamos a viver
Como há dez anos atrás
E a cada hora que passa
Envelhecemos dez semanas...

Vamos lá, tudo bem!
Eu só quero me divertir
Esquecer dessa noite
Ter um lugar legal prá ir...

Já entregamos o alvo
E a artilharia
Comparamos nossas vidas
E esperamos que um dia
Nossas vidas
Possam se encontrar...

Quando me vi
Tendo de viver
Comigo apenas
E com o mundo
Você me veio
Como um sonho bom
E me assustei
Não sou perfeito...

Eu não esqueço
A riqueza que nós temos
Ninguém consegue perceber
E de pensar nisso tudo
Eu, homem feito
Tive medo
E não consegui dormir...

sábado, julho 19, 2008

::: Homens do mercado :::
Tati Bernardi

Acordei assim meio sem ter o que fazer, uma vontade danada de ter alguém pra rir ou pra ficar pelada. Tem desse modelo dois em um que serve pra rir e pra ficar pelada, moço? Tem, senhora. Senhorita, por favor. Ainda ninguém quis casar comigo. É pra viagem ou vai comer agora? Vou comer no carro, embrulha mas não capricha muito não que eu tô com pressa.
Impressionante essa tecnologia dois em um. Eu realmente dou risada a noite toda e de tanto rir vai dando aquele calor, aquela vontade de ficar pelada. A indústria do entretenimento demorou mas descobriu que o tesão da mulher tá na laringe. Quanto mais a gente dá gargalhada, maior a vontade de abrir a perna. Boneco bom esse modelo loiro magrelo, pena que vende aos montes e quase todo mundo pode ter. No dia seguinte começou a falhar. As piadas eram as mesmas, o sexo ficou sem magia e o botão do amor deu pau. Já foi o tempo que a gente dava valor para um produto ao ponto de brigar por ele. Hoje em dia tá tudo tão fácil que comprar outro sai mais barato que tentar consertar. Tá lá o moço loiro ao lado da lata de lixo do meu prédio. Talvez a Emengarda faça bom uso dele, talvez como abajour. Ele é branquelo demais.
Aí tava meio de bobeira andando pelas lojas e pensei: por que não um desses garotinhos com brilho nos olhos? Desses cheios de vontade de vencer na vida e de viver a vida. Adoro esses garotinhos que não fedem a frustrações e que tentam desesperadamente parecer homens. Talvez eu goste deles porque eu também só tente parecer mulher. Bom, dei algumas moedas na mão da minha menina e dessa vez foi ela quem saiu feliz da vida com uma imensa sacola cor-de-rosa. Pode tirar a roupa dele, mãe? Pode garotinha de Maria-Chiquinha, mas depois não vá dizer que eu não avisei: no dia seguinte dá um vaziozinho no coração. Nada que não passe com as próximas compras. Pode dormir abraçadinha nele, mãe? Pode, mas aí piora mais um pouco. Melhor um coração vazio e inteiro do que um todo despedaçado. Mas vai lá, filhinha, é bom pra você aprender. Brinca bastante com ele, depois, quando ele se autodestruir em alguns segundos, mamãe compra outro pra você. Chora não menina boba. Era só um garotinho igual a 345 que têm nas lojas. Que modelo você quer agora? Quer o modelo que fala irado, o que fala maior vibe ou o que fala insano? Ah, mãe, queria um que falasse coisas mais inteligentes e profundas, tem desse? Tem, mas custa um pouco mais caro porque é importado de outro planeta. Nada que dez vezes no cartão não resolva.
Acho que preciso de tratamento psiquiátrico. Vou levar as reservas da minha alma à falência se continuar gastando desse jeito. Nem bem enjôo de uma compra já quero logo sentir de novo o prazer de tirar um encantamento da caixa. Novinho em folha. Oi, será que por acaso vocês não tem aí um modelo que já vem com assunto? To sentindo uma falta danada de ter com quem conversar. Tem, claro que tem. Esse aqui já vem com três cartuchos sobre cinema europeu e você ainda leva a nova revista Piauí totalmente de graça. Volto pra casa com meu novo joguinho. Fico até um pouco cansada porque o manual de instruções desse modelo vem num português mais rebuscado. Quase sinto saudade do antigo boneco que com o mesmo comando falava irado e abaixava as calças. Mas acho que já tenho idade para passar de fase e tentar uma conquista mais difícil. Putz, botaram toda tecnologia no cérebro e esqueceram do resto. Boneco chato esse, tá louco. Sexo que não toca música e coração que não pisca. Já foi o tempo que os brinquedos faziam pirotecnia. Esse nem vôa e nem me faz voar. Começo a me irritar, essa indústria do entretenimento faz de propósito: não existe o boneco perfeito justamente pra você voltar na loja todos os dias.
Mas cansei desse papo, não sou besta não. Vou acabar pobre desse jeito. Ei, moço, vocês não tem aí um que me faça rir, me dê tesão, seja inteligente e tenha coração? Ah, e de preferência um forte, que não quebre tão fácil. E que venha com vários cartuchos de assuntos que é para eu não enjoar. Opa, e que tenha garantia, claro. A pior coisa são esses bonecos que a gente compra barato mas vêm sem nota. Tem não, moça. Esse tá em falta. Fizeram uma versão limitada e vendeu tudo no mesmo dia. Deixa seu nome ali na lista de espera que quando chegar a gente te liga. Meu nome já tá lá há 28 anos, moço. Mulher já nasce querendo um desses. Desculpa moça, vou ficar devendo. Tudo bem, eu já sabia. Mas já que é pra esperar sentada, me vê aí um modelo com o joystick bem grande.
::: O Retorno de Saturno :::
Detonautas

Visão do espaço estamos tão distantes
Se acelero os passos sigo a voz do meu coração.
Ontem eu fui dormir mais tarde um pouco.

E tudo vai indo bem...

Venço o cansaço e medo do futuro.
No teu abraço é que encontro a cura do mal
Hoje eu acordei e te quis por perto.

Você não sai do meu pensamento
E eu me questiono aqui se isso é normal.
Não precisa ser de novo assim tudo igual.

Entre o retorno de saturno e o seu,
Busco uma resposta que acalme o meu coração.
Do amanhã não sei o que posso esperar.

Você não sai do meu pensamento
E eu me questiono aqui se isso é normal.
Você não sai do meu pensamento
E eu me pergunto aqui, se o natural
Vai dizer que o amor chegou no final.
Não precisa ser de novo assim tudo igual.

::: Mulher de fases :::
Raimundos

Que mulher ruim
Jogou minhas coisas fora
Disse que em sua cama
Eu não deito mais não...

A casa é minha
Você que vai embora
Já prá saia da sua mãe
E deixa meu colchão...

Ela é "pro" na arte
De pentelhar e aziar
É campeã do mundo
A raiva era tanta
Que eu nem reparei
Que a lua, diminuia...

A doida
Tá me beijando a horas
Disse que se for sem eu
Não quer viver mais não
Me diz Deus
O que é que eu faço agora?
Se me olhando desse jeito
Ela me tem na mão
-Meu filho agüenta
Quem mandou você gostar
Dessa Mulher de Fases?...

Complicada e perfeitinha
Você me apareceu
Era tudo que eu queria
Estrela da sorte
Quando à noite ela surgia
Meu bem você cresceu
Meu namoro é na folhinha
Mulher de Fases...

Põe fermento, põe as bomba
Qualquer coisa que aumente
A deixe bem maior que o sol
Pouca gente sabe que na noite
O frio é quente e arde
E eu acendi...

Até sem luz dá prá te enxergar
O lençol fazendo "congo-blue"
É pena, eu sei
Amanhã já vai miar
Se agüente
Que lá vem chumbo quente...

quarta-feira, julho 16, 2008

::: Too Little, Too Late :::
Jojo

Come with me
Stay the night
You say the words but boy it don't feel right
What do you expect me to say?
You know it's just too little too late
You take my hand
And you say you've changed
But boy you know your begging don't fool me
Because to you it's just a game
You know it's just too little too late

So let me on down
Cause time has made me strong
I'm starting to move on
I'm gonna say this now
Your chance has come and gone
And you know

It's just too little too late
A little too wrong
And i can't wait
Boy you know all the right things to say
You know it's just too little too late
You say you dream of my face
But you don't like me
You just like the chase
To be real it doesn't matter anyway
You know it's just too little too late

I was young and in love
I gave you everything but it wasn't enough
And now you wanna communicate
You know it's just too little too late

Go find someone else
In letting you go i'm loving myself
You got a problem
But don't come asking me for help
Cause you know

It's just too little too late
A little too wrong
And i can't wait
Boy you know all the right things to say
You know it's just too little too late
You say you dream about me
But you don't like me
You just like the chase
To be real it doesn't matter anyway
You know it's just too little too late

I can love with all of my heart baby
I know i have so much to give(i have so much to give)
With a player like you i don't have a prayer
That's the way to live

sábado, julho 12, 2008

::: Mais Uma de Amor Para Quem Não Ama :::
Tati Bernardi

Ele me espera no restaurante das árvores. Diz que até o garçom já sabe que eu sou como sou, de tanto que ele não tem outro assunto. Ele me espera, pede mais pãezinhos, ensaia um bom vinho para mim, limpa o suor da cara no guardanapo. E vai esperar por toda a noite.

Mal sabe ele que acabo de responder a uma mensagem de texto dizendo que vou chegar em minutos. Ele me espera com a porta do banheiro aberta, enquanto esfrega seu centro num ato de pureza. Ele quer sacanagem comigo, mas daquele tipo de sacanagem pura com direito a perguntar baixinho "tá doendo"?

Não muito longe dali ele se prepara para sair com os amigos, seus amigos tão deliciosos quanto ele. Passa o mesmo perfume que eu, mas na versão masculina. Seu charme está em ter transformado a sua dor em ironia. Adoro pessoas sofridas. Adoro o ódio medroso e óbvio das pessoas sofridas. Talvez amanhã a gente possa se odiar juntos, num ato de sinceridade livre e animal perante tantos amores pálidos pela cidade corretinha. A cidade corretinha que faz bodas disso e bodas daquilo, mas se entope da porra do Prozac, mas se entope da porra do canal de sexo com aquelas mulheres de sobrancelha desenhada. Mas se entope da porra da opinião dos outros sobre o que é ter chegado lá. Ninguém chega a porra de lugar nenhum.

Mas eu chego, e estaciono meu carro lá dentro, como se fosse dona do pedaço. Ao menos por algumas horas eu serei dona de um pedaço que agora é esfregado no banho em mais um ato de pureza. A sacanagem óbvia é muito mais pura que o ódio envergonhado das bodas disso e das bodas daquilo.

Ele pede a conta e vai embora. Jantou sozinho, o coitado. Se tenho pena? Nenhuma. Nenhuma. Cavoco meu ser até quase me virar do avesso para resgatar um pouco de bonitinho em minha alma, mas descubro que não tenho nenhuma pena dele. Não gosto de quem não amo e ponto final.

Ele encontra os amigos deliciosos e vai ganhar a noite. Se perde muito para tal. Mas ganha alguma coisa sim, sempre se ganha alguma coisa. Talvez uma rinite alérgica ou um buraco no peito. Mas sempre se ganha alguma coisa na noite.

Eu espero comportada do lado de fora enquanto ele termina de se esfregar. Sei da bucha porque sua pele chega quente e vermelha. Tenho vontade de colar minhas veias na dele para que meu sangue ganhe aquele mesmo movimento. Desde que ele me contou numa noite besta que queria salvar o mundo e isso não me soou mais um papinho furado sobre salvar o mundo, fiquei assim. Tenho vontade que meu sangue e o dele passeiem juntos.

Nós vamos mais uma vez nos olhar querendo transar até amanhã, mas vamos apenas assistir à novela e tentar adivinhar as falas. Nós vamos mais uma vez querer atravessar as ruas de mãos dadas, mas vamos brincar de dar ombradas um no outro. Eu prefiro morrer sua amiga do que quebrar algum elo misterioso e te perder para sempre. Te perder como sempre.

Ele escuta uma dessas músicas da modinha ao estilo Madeleine Peyroux antes de dormir e tenta entender qual é o meu problema. Será que eu não fui porque ainda sofro por aquele amor mal resolvido? Será que eu não fui porque tenho medo do amor? Será que eu não fui porque tenho medo de sofrer? Ahhh, os homens apaixonados. Ainda mais burros que as mulheres que acreditam na dor irônica. Eu não fui apenas por uma razão: eu não gosto de quem eu não amo e fim de papo.

Tiro o carro da garagem dele e corro para encontrar o outro e seus amigos deliciosos. Ele tem braço de estivador e tem um buraco entre o começo da perna e o fim do tronco. Coisa de homem sarado. Só não digo que ele parece o Bob da Barbie porque esse era eunuco e vivia rindo. Se bem que ele vive rindo e ri tanto que não parece ter centro. Parece eunuco.

Adoro sua virilha, sou obcecada por ela. Adoro seus amigos fortes. Adoro tudo o que dói nele, como diria aquela fala do filme "Closer" que eu adoro. Adoro que posso encontrá-lo sempre depois das três da manhã, sempre depois dos jantares que eu não vou e das transas que eu não faço. Adoro que posso morrer por ele ou nem lembrar que ele existe. Amor de pica é assim mesmo: o maior e o mais leviano de todos.

Ele acabou de me descobrir pela Internet e dorme tentando me encontrar, tentando me encaixar. Sente uma pontada no peito e uma pontada lá embaixo. Deve ser engraçado ser homem e amar assim de maneiras tão opostas e complementares. Ele não sabe que tudo o que eu mais quero é casar e ser mãe de um casalzinho que dança pelado antes do banho. Mas esse meu querer está esquecido em algum canto de mim, está esquecido depois de tanto eu querer isso e a vida me dizer que eu ainda não podia.

Ganhei a porra da dor irônica. Ainda que seja estupidez acreditar nela. Agora o que eu quero é saber que o outro se esfrega no banho, que o outro se fode no restaurante, que o outro me espera sempre depois das três e tem amigos deliciosos. Que o outro é especial demais, mas talvez ainda não seja o personagem principal daquela festa de final de novela, com todos os personagens de bem.

Está acabando a história, mas ainda dá tempo de não amar mais um pouquinho. Mando uma mensagem para ele, que a essa altura dorme abraçado a uma menina que já encheu o saco, achando que encontrou a mulher da vida. Mando uma mensagem para ele, que a essa altura dorme demais como sempre e já deve ter me esquecido, mesmo lembrando de mim em todos os intervalos de coisa melhor pra pensar. Mando uma mensagem para ele, ainda que ele já tenha desistido do amor e prefira o cheiro de chiclete com chulé da nuca da sua filha.

Durmo com mais de trinta homens, e mais uma vez sozinha. Mas esse texto, juro, é uma comemoração a isso. No fundo, no fundo, eu gosto. Ainda que eu me sacaneie com pureza e me pergunte baixinho: tá doendo?

quinta-feira, julho 10, 2008

::: O Dia Seguinte. Dele. :::
Tati Bernardi

Ele acorda e cantarola a música no banho. Over and over and over. Ela está obcecada pelo Hot Chip e passou a doença a diante.
Ele cantarola e lembra que foi nessa música que ela achou que a cadeira giratória do computador podia contribuir com a dança. Ri. Sente tesão. Acha o mundo ridículo e feliz. Lembra que tava boa a vida procurando. Encontrar dá medo, preguiça e uma sensação estranha de estar se perdendo. Será que eu vou querer namorar essa louca? Será que essa louca vai querer namorar comigo?
Aí ele lembra. Caraca! É mesmo! A menina escreve. Sem pudor. Falaram pra ele. A essa altura do campeonato, já deve ter um texto publicado falando da noite anterior. Será que ela achou bom? Será que ela vai publicar o tamanho da minha alma? Da minha tatuagem? Do meu pé?
Ele corre com o banho. Ainda cantarola, mas agora é com um pouco de medo. Precisa entrar logo naquele site desgraçado. Todo cheio de desenhinhos inacabados e leves. Mas é ali mesmo que ela acaba com todo mundo e sem nenhuma leveza.
Corre com seu carro que ainda tem o cheiro dela e uns fios de cabelo, agora castanhos escuros, pendurados no assento do passageiro. Foi bom. A noite foi boa. Ela não vai falar mal de mim. E também não vai falar nada de mim. Nem bem. Como ele quer que ela seja misteriosa e suma durante todo o dia de hoje. Ele quer sentir o frio na barriga, o nervoso pra saber se ela vai atender ou não. Não seja fácil, minha filha. Não escreve que gostou. Deixa eu sofrer um pouco. Deixa.
Ele chega na agência e não vai direto pro café. Espera ninguém estar passando atrás dele e digita o site dela. Sua frio, melhor pegar o café. Não, vai de uma vez. Vai. Abre. E de repente. Lá está. Um texto. Um texto pra ele. Caramba, ela já escreveu? É o primeiro texto que alguém escreve pra ele, tirando uma tontinha da época da faculdade que botava frases do tipo “eu sei que quando tiver de ser, será” nas cartinhas que ele nem lembra mais onde foram parar. Coitada. Agora é uma escritora de verdade. Ele ri, porque a escritora de verdade se acha um pouco dizendo que é de verdade.
Ele gosta dela. Não tem mais como fugir. É, da medo. Ela deve estar com medo também. Gostar é começar o inferno tudo de novo. Mas ela, quem diria, escreve lá no texto que topa. Topa começar tudo de novo. E faltando dois parágrafos pra terminar o texto, ela manda, na lata mesmo: “quero te ver hoje”. O que será que ele vai responder?
Ele então pega o café. E sai cantando como se o dia estivesse diferente. Over and over and over and over...

quarta-feira, julho 09, 2008

::: Das coisas que a gente sempre sabe :::
Ana Paula Mangeon

A gente sabe, a gente sempre sabe
quando a coisa está bem ou está mal.
Quando o olho perde o brilho, quando o sorriso ilumina.
A gente sempre sabe quando a mão quer ou não a mão,
quando a presença é ou não mais é imprescindível.
A gente sempre sabe o limite da paixão,
onde transmuta em carinho,
quando vira só admiração
e quando já estava mesmo tudo perdido.

A gente sabe, a gente sempre sabe.

A gente sempre sabe a hora de avançar e a hora de recuar.
A gente sempre sabe reconhecer subterfúgios e estratagemas.
A gente sempre sabe o pulo do gato e a rota de fuga.
A gente sempre sabe o início, o meio e o fim.

A gente sabe, a gente sempre sabe.

E a gente sempre sabe que às vezes a gente corta,
tenta arrancar, lava com álcool e removedor,
mas a coisa fica ainda ali, incubada, latente,
aguardando uma distração para se manifestar.

São velhas conhecidas as mentiras que a gente inventa.

A gente sabe, a gente sempre sabe quando a fonte seca
e quando ainda há água para nossa sede eterna.

segunda-feira, julho 07, 2008

::: O Tempo Não Pára :::
Cazuza

Disparo contra o sol
Sou forte, sou por acaso
Minha metralhadora cheia de mágoas
Eu sou um cara
Cansado de correr
Na direção contrária
Sem pódio de chegada ou beijo de namorada
Eu sou mais um cara

Mas se você achar
Que eu tô derrotado
Saiba que ainda estão rolando os dados
Porque o tempo, o tempo não pára

Dias sim, dias não
Eu vou sobrevivendo sem um arranhão
Da caridade de quem me detesta

A tua piscina tá cheia de ratos
Tuas idéias não correspondem aos fatos
O tempo não pára

Eu vejo o futuro repetir o passado
Eu vejo um museu de grandes novidades
O tempo não pára
Não pára, não, não pára

Eu não tenho data pra comemorar
Às vezes os meus dias são de par em par
Procurando uma agulha num palheiro

Nas noites de frio é melhor nem nascer
Nas de calor, se escolhe: é matar ou morrer
E assim nos tornamos brasileiros
Te chamam de ladrão, de bicha, maconheiro
Transformam o país inteiro num puteiro
Pois assim se ganha mais dinheiro

A tua piscina tá cheia de ratos
Tuas idéias não correspondem aos fatos
O tempo não pára

Eu vejo o futuro repetir o passado
Eu vejo um museu de grandes novidades
O tempo não pára
Não pára, não, não pára

Dias sim, dias não
Eu vou sobrevivendo sem um arranhão
Da caridade de quem me detesta

A tua piscina tá cheia de ratos
Tuas idéias não correspondem aos fatos
O tempo não pára

Eu vejo o futuro repetir o passado
Eu vejo um museu de grandes novidades
O tempo não pára
Não pára, não, não pára

domingo, julho 06, 2008

::: Despedida :::
(trecho do filme Outono em NY)


Will: "- O tempo não pode arrancar do pássaro a sua asa.
Pássaro e asa, juntos são inseparáveis.
nada que voa...
nem a cotovia, nem você...
podem morrer como os outros morrem."

Charlotte: - O que foi que eu fiz com você?

Will: - Matou-me para as outras mulheres.

Charlotte: - Não, eu melhorei você para elas...

quinta-feira, julho 03, 2008

::: As Razões Que o Amor Desconhece :::
Martha Medeiros

Você ama aquela petulante.
Você escreveu dúzias de cartas que ela não respondeu,
você deu flores que ela deixou a seco,
você levou para conhecer a sua mãe e ela foi de blusa transparente.
Você gosta de rock e ela de chorinho,
você gosta de praia e ela tem alergia a sol,
você abomina o Natal e ela detesta o Ano Novo,
nem no ódio vocês combinam.
Então?

Então, que ela tem um jeito de sorrir que o deixa imobilizado,
o beijo dela é mais viciante do que LSD,
você adora brigar com ela e ela adora implicar com você. Isso tem nome...

Você ama aquele cafajeste.
Ele diz que vai ligar e não liga,
ele veste o primeiro trapo que encontra no armário,
ele escuta Sivuca.
Ele não emplaca uma semana nos empregos,
está sempre duro, e é meio galinha.
Ele não tem a menor vocação para príncipe encantado,
e ainda assim você não consegue despachá-lo.
Quando a mão dele toca na sua nuca,você derrete feito manteiga.
Por que você ama este cara ?

Não pergunte pra mim.
Você é inteligente. Lê livros, revistas, jornais.
Gosta dos filmes de Woody Allen, dos irmãos Cohen e do Robert Altman, mas sabe que uma boa comédia romântica também tem o seu valor. É bonita.
Seu cabelo nasceu para ser sacudido num comercial de xampu e seu corpo tem todas as curvas no lugar.
Independente, emprego fixo, bom saldo no banco.
Gosta de viajar, de música, tem loucura por computador e seu fettuccine ao pesto é imbatível.
Você tem bom humor, não pega no pé de ninguém e adora sexo.

Com um currículo desses, criatura,
por que diabo está sem um amor ?
Ah, o amor, essa raposa !...
Quem dera o amor não fosse um sentimento, mas uma equação matemática:
eu linda + você inteligente = dois apaixonados.
Não funciona assim.
Ninguém ama outra pessoa pelas qualidades que ela tem.
Caso contrário os honestos, simpáticos e não-fumantes teriam uma fila de pretendentes batendo à porta.
O amor não é chegado a fazer contas, não obedece à razão.
O verdadeiro amor acontece por empatia, por magnetismo, por conjunção estelar.
Costuma ser despertado mais pelas flechas do cupido que por uma ficha limpa.

Ninguém ama outra pessoa porque ela é educada, veste-se bem e é fã do Caetano.
Isso são só referências.
Ama-se pelo cheiro, pelo mistério, pela paz que o outro lhe dá, ou pelo tormento que provoca.
Ama-se pelo tom de voz, pela maneira que os olhos piscam, pela fragilidade que se revela quando menos se espera.
Amar não requer conhecimento prévio nem consulta ao SPC.

Ama-se justamente pelo que o amor tem de indefinível.
Honestos existem aos milhares,generosos tem às pencas, bons motoristas e bons pais de família, tá assim, ó...
Mas ninguém consegue ser do jeito que o amor da sua vida é...