quinta-feira, dezembro 04, 2008

::: Correspondência Velada :::
Ana Paula Mangeon

O espaço ficou distante demais
e eu já não conto estrelas.
Crescemos e nos tornamos
descuidados conosco.

(Eu sempre muito mais atabalhoada que você).

Os pés no chão não parecem âncoras,
mas são.
E as naus vagam feito
barquinhos de papel
passeando numa sarjeta qualquer
num dia, assim, mais pluvial.

Eu tenho sede de outras coisas
Aquele arrepio do vento,
de tesão em ir, é só um suspiro frio.

As hibernações viraram
conseqüências simples
das coisas mundanas e tangíveis
que nos tornam os egoísmos aceitáveis
e nos fazem pedir desculpas pelas ausências
prometendo presenças sem círculos vermelhos na agenda.

(Pena que meu umbigo não me dê seus bons conselhos.
Acho que eu me preocupo mais com ele
que ele comigo no final das contas.)

Um dia os bilhetinhos iam rarear
Eu sabia.
Você também.
E haveria outros destinatários
Para tentar roubar, sem sucesso,
Este algo que é só meu e seu.

Talvez seja por isso que hoje
os carteiros não mais se anunciem:
Eles apenas enfiam suas palavras
por debaixo de minha porta,
sem procurar saber
quando eu estou em casa
dormindo comigo.
Sem o cuidado que merecem
essas cartas silenciosas
que chegam mesmo sem que você indique o endereço.

Essas cartas
que você me escreve com caneta permanente
em folhas de papel-espelho.

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