sexta-feira, outubro 09, 2009

::: A escola dos meus sonhos :::
Denise Fraga

Isabel Cristina Leopoldina Augusta Micaela Gabriela Rafaela Gonzaga de Orleans e Bragança. Não sei por que, mas nunca mais me esqueci do nome inteiro da princesa Isabel. Entra ano, sai ano, e ele continua na minha cabeça. Pra que serve saber o nome todo da princesa Isabel? Pra nada. A não ser para dizer aos seus amigos que você o sabe ainda aos 44 anos, mesmo o tendo decorado aos 11. E por que o decorei? Sei lá. Lembro do nome inteiro da princesa Isabel, mas sou incapaz de me lembrar por que o tenho na cabeça. Coisinha ainda desconhecida esse nosso cérebro, não? Mas me lembro que foi na escola. Também sei ainda de cor algumas datas da História do Brasil, algumas capitais, a tabuada e, curiosamente, algumas palavras ainda flutuam em minha mente, completamente desvinculadas do seu significado. Logaritmo, por exemplo. Não tenho mais a menor ideia do que seja logaritmo.

Quando vejo agora meus pequenos às voltas com suas intermináveis lições, nunca deixo de pensar, muito secretamente, qual será a exata serventia de todas essas coisas que ainda se ensinam nas escolas. Sei que lá também se aprende regras de convivência, raciocínio lógico etc. e tal, mas será que não existem coisas mais “inesquecíveis por natureza” para ocupar, por exemplo, o lugar das cadeias de carbono e hidrogênio? Nunca vi serventia pra tal quebra-cabeça, a não ser aumentar minha preguiça à aula de Química. E quebra-cabeça por quebra-cabeça, um jogo de xadrez talvez ensinasse tanto quanto. É provável que existam pessoas que adoravam as aulas de Química, independente de, como eu, terem seguido carreiras bem distantes dos laboratórios, mas não consigo deixar de pensar que, se ensinassem Investigação de Pequenas Alegrias no lugar de Química, e deixassem a Química pra quem quisesse trabalhar com ela algum dia, o mundo seria melhor até pros químicos. Em vez de Química 3, apenas um ano de Química para conhecimento geral e vários anos de Exercício do Diálogo, por exemplo. Utopia. Mas que gostaríamos mais de ir à escola se nos ensinassem coisas que pudéssemos aplicar imediatamente em nosso dia a dia e durante toda a vida, lá isso é verdade. Simplesmente por necessidade, não deletaríamos instantaneamente de nossa memória o que tínhamos acabado de estudar pra prova. Provavelmente, nem estudaríamos pra prova.

Na escola dos meus sonhos, teria matemática para o raciocínio lógico, xadrez para o raciocínio projetado, esgrima para a leveza e rapidez dos reflexos, história contada em histórias, línguas, interpretação de texto, esportes, muitas idas ao teatro, ao cinema, literatura e arte em geral para a compreensão poética do mundo. Apenas um ou dois professores, muito bem preparados e que ganhassem muito, muito bem para levar nossos filhos a andar pela cidade visitando bairros, fábricas, hospitais, conhecendo profissões, observando e apreendendo o mundo. Duas vezes por semana, aula de Compreensão da Imperfeição Humana. Total utopia. Nossa bandeira leva até hoje um “Ordem e Progresso” retirado da linda frase da doutrina positivista: “O amor por princípio, a ordem como meio e o progresso por fim”. Simplesmente, um dia, alguém achou que não teria problema tirar o amor e deixar só o ordem e progresso. Talvez tenha sido até por falta de espaço. Tiraram “só” o amor! A frase positivista eu não aprendi na escola, mas sei nosso imenso hino de cor, quantas estrelas temos na bandeira e o nome da princesa Isabel. Ah! Na escola dos meus sonhos, teria também uma matéria chamada Amor por Princípio. Perdoem-me. Só utopia.

Nenhum comentário: